António Pedro Costa, Universidade de Aveiro (Portugal)
Investigador do Centro de Investigação em Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF), Departamento de Educação e de Psicologia, da Universidade de Aveiro e colaborador do Laboratório de Inteligência Artificial e Ciência de Computadores (LIACC), da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Isabel Pinho, Universidade de Aveiro (Portugal)
Investigadora da Universidade de Aveiro, o seu trabalho atual está relacionado com Avaliação de Investigação, Avaliação de Aprendizagem, Redes, Revisão de Literatura.
Yakamury Lira, Universidade de Aveiro (Portugal)
Investigador da Universidade de Aveiro.
Os investigadores na área das ciências sociais e humanas estão bastante entusiasmados com as formas pelas quais as ferramentas de inteligência artificial (IA) podem melhorar a investigação. É bastante apelativo, enquanto investigador, saber usar ferramentas para melhorar a produtividade e a objetividade através da superação das limitações humanas, designadas neste texto como (in)competências. São inúmeras as ferramentas, essencialmente de Inteligência Artificial Generativa (GenAI), que permitem auxiliar o investigador nas diferentes fases de um projeto de investigação.
No artigo “Artificial intelligence and illusions of understanding in scientific research” os autores Messeri e Crockett (2024) tentam explanar o motivo pelo qual as ferramentas de IA são tão atrativas e quais os riscos de as implementar em todo o processo de investigação. Os mesmos autores defendem que as soluções de IA disponíveis também podem fazer submergir as nossas limitações cognitivas, tornando os investigadores vulneráveis a ilusões de compreensão. Continuando a explorar o artigo supracitado, os autores afirmam que tais ilusões obscurecem a capacidade de a comunidade científica ver a formação de monoculturas científicas, nas quais alguns tipos de métodos, questões e pontos de vista passam a dominar abordagens alternativas, tornando a ciência menos inovadora e mais vulnerável a erros (Raj, 2024; Roberts, 2024). A proliferação de ferramentas de IA na ciência pode ter o potencial de incrementar a produtividade da investigação científica, mas pode não melhorar a compreensão aprofundada dos assuntos em questão (Andrade-Girón et al., 2024; Roberts, 2024). Ao analisar o uso destas ferramentas, fornece-se uma estrutura para avançar nas discussões sobre a produção responsável de conhecimento na era da IA.
Neste contexto, foi constituído um grupo de trabalho que pretende desenvolver artefactos que possibilitem aos profissionais do ensino superior, essencialmente, professores, estudantes e investigadores, identificar as competências transversais e específicas que devem ser exploradas nos projetos de investigação na área das ciências sociais e humanas, com maior enfâse na Educação. Por exemplo, de um ponto de vista pós-humanista, pretende-se examinar como a aplicação das metodologias investigação e da IA pelo investigador influencia os sujeitos e os objetos de investigação, tendo em conta que a responsabilidade ética se situa no investigador humano.
As competências percebidas dos investigadores tornam-se essenciais em todo o desenvolvimento e aprofundamento de possíveis novas competências. De acordo com Woods e colaboradores (2016), no artigo “Researcher reflexivity: exploring the impacts of CAQDAS use” no contexto dos CAQDAS (Computer-Assisted Qualitative Data Analysis), o comportamento do investigador não deve ser dominado pelo “comportamento” dos modelos de linguagem.
Neste sentido, o grupo de trabalho avançou com o estudo bibliométrico, apresentado numa conferência, intitulado “Bibliometric and Comparative Analysis of Generative Artificial Intelligence in Education Research” (2024). Esta análise bibliométrica forneceu uma perspetiva global sobre a Inteligência Artificial Generativa (GenAI) na Investigação em Educação, usando as bases de dados Scopus e Web of Science (WoS). Posteriormente, na escrita do capítulo de livro “Competence frameworks for Exploring Generative AI in Education” a ser publicado pela editora Cabi em 2025, foram apresentadas as primeiras explanações, centrando-se na conceção de quadros de competências para uma implementação equitativa e inclusiva. Neste capítulo, propõe-se um modelo de competências, em que se enfatiza o pensamento crítico, a resolução de problemas, a colaboração, a ética e a aprendizagem contínua como essenciais para a integração da GenAI. Realça ainda a importância da transparência, da tomada de decisões éticas e da colaboração entre as partes interessadas envolvidas na educação em/com IA. Garantir a inclusão e a equidade é crucial, tendo em consideração as influências culturais e incorporando diversas perspetivas no desenvolvimento curricular. O capítulo termina abordando os desafios e oportunidades na integração das ferramentas GenAI em ambientes educativos, enfatizando a necessidade de formação abrangente, motivação e apoio contínuo para educadores e alunos. Globalmente, o capítulo promove a utilização responsável da GenAI para melhorar as experiências de aprendizagem e promover a educação inclusiva.
Diante deste panorama, a formação contínua dos investigadores emerge como um pilar essencial para garantir o uso consciente e ético das ferramentas de IA (Flores-Vivar & García-Peñalvo, 2023). Ao promover uma cultura de reflexividade, pensamento crítico e ética, é possível mitigar os efeitos negativos e assegurar que a IA Generativa seja uma ferramenta que complementa, assessoria e não substitui as capacidades humanas, contrapondo os riscos apontados por Monteiro et al. (2024) e Roberts (2024). Assim, a integração equilibrada entre as potencialidades da IA e as competências dos investigadores será decisiva para garantir que o futuro da investigação em educação seja mais inclusiva, inovadora e diversificada (Guárdia Ortiz et al. 2024; Kadaruddin, 2023). Ao habilitar os investigadores a interpretar e questionar as inúmeras possibilidades de resultados gerados pela GenAI, é possível evitar vieses e interpretações erróneas que poderão impactar negativamente a qualidade da investigação.
Em suma, por um lado temos um cenário otimista, no qual os investigadores utilizam a GenAI de forma colaborativa e crítica, ampliando a inovação e garantindo a inclusão de diferentes perspetivas e, por outro lado, um cenário cauteloso, onde a dependência excessiva da GenAI compromete a diversidade metodológica e a qualidade dos projetos de investigação. O caminho a ser seguido dependerá da nossa capacidade de mediar as competências humanas com o poder da tecnologia, visando sempre o panorama equitativo, ético e responsável do conhecimento que estamos a construir.
Referências
Andrade-Girón, D., Marín-Rodriguez, W., Sandivar-Rosas, J., Carreño-Cisneros, E., Susanibar-Ramirez, E., Zuñiga-Rojas, M., Angeles-Morales, J., & Villarreal-Torres, H. (2024). Generative artificial intelligence in higher education learning: A review based on academic databases. Iberoamerican Journal of Science Measurement and Communication, 4(1), 1–16. https://doi.org/10.47909/ijsmc.101
Baek, E. O., & Wilson, R. V. (2024). An Inquiry Into the Use of Generative AI and Its Implications in Education. International Journal of Adult Education and Technology, 15(1), 1–14. https://doi.org/10.4018/IJAET.349233
Faraasyatul’Alam, G. F., Wiyono, B. B., Burhanuddin, B., Muslihati, M., & Mujaidah, A. (2024). Artificial Intelligence in Education World: Opportunities, Challenges, and Future Research Recommendations. Fahima, 3(2), 223–234. https://doi.org/10.54622/fahima.v3i2.350
Flores-Vivar, J.-M., & García-Peñalvo, F.-J. (2023). Reflections on the ethics, potential, and challenges of artificial intelligence in the framework of quality education (SDG4). Comunicar, 31(74), 37–47. https://doi.org/10.3916/C74-2023-03
Guárdia Ortiz, L., Bekerman, Z., & Zapata Ros, M. (2024). Presentación del número especial “IA generativa, ChatGPT y Educación. Consecuencias para el Aprendizaje Inteligente y la Evaluación Educativa.” Revista de Educación a Distancia (RED), 24(78). https://doi.org/10.6018/red.609801
Kadaruddin, K. (2023). Empowering Education through Generative AI: Innovative Instructional Strategies for Tomorrow’s Learners. International Journal of Business, Law, and Education, 4(2), 618–625. https://doi.org/10.56442/ijble.v4i2.215
Lima, L. A. de O., Gomes, L. P., Silva, P. H. da S. e, Oliveira, E. F. da S., Nascimento, M. do, Tourem, R. V., Gonçalves, J. N. de A., Lima, A. da S., Sobral, R., & Santos, I. da M. P. dos. (2024). Artificial intelligence and its use in the educational process. In Navigating through the knowledge of education. Seven Editora. https://doi.org/10.56238/sevened2024.002-043
Monteiro, E. L., dos Santos, A. A., da Silva, J. A., de Oliveira, A. A., Monteiro, R. R., de Campos, M. C. V., Sousa, T. S. R., Borba, L. M., Machado, M. L., & das Graças Lacerda da Cunha, D. (2024). Inteligência artificial na educação: aplicações e implicações para o ensino e a aprendizagem. Caderno Pedagógico. https://api.semanticscholar.org/CorpusID:269038444
Moresi, E. A. D., Pinho, I., Costa, A. P., Burneo, P. S., Machado, L. B., & Freitas, F. M. (2024). Bibliometric and Comparative Analysis of Generative Artificial Intelligence in Education Research. 19th Iberian Conference on Information Systems and Technologies (CISTI), no prelo.
Messeri, L., & Crockett, M. J. (2024). Artificial intelligence and illusions of understanding in scientific research. Nature, 627(8002), 49–58. https://doi.org/10.1038/s41586-024-07146-0
Raj, J. A. S. (2024). GenAI and the Future of Education and Research. SSRN Electronic Journal. https://doi.org/10.2139/ssrn.4686338
Roberts, L. W. (2024). Addressing the Novel Implications of Generative AI for Academic Publishing, Education, and Research. Academic Medicine, 99(5), 471–473. https://doi.org/10.1097/ACM.0000000000005667
Woods, M., Macklin, R., & Lewis, G. K. (2016). Researcher reflexivity: exploring the impacts of CAQDAS use. International Journal of Social Research Methodology, 19(4), 385–403. https://doi.org/10.1080/13645579.2015.1023964