António Pedro Costa, Universidade de Aveiro (Portugal)
Investigador do Centro de Investigação em Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF), Departamento de Educação e de Psicologia, da Universidade de Aveiro e colaborador do Laboratório de Inteligência Artificial e Ciência de Computadores (LIACC), da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Adriana Santos, Instituto Federal da Bahia (Brasil)
Professora no Instituto Federal da Bahia (IFBA), Brasil e Doutoranda IFBA/UFBA/UNEB com estágio na Universidade de Aveiro (Portugal).
Usar ferramentas de Inteligência Artificial (IA), em particular de IA Generativa (GenAI), como suporte à escrita de artigos científicos pode ser uma abordagem valiosa, especialmente na fase de revisão de literatura, processo que pode ser otimizado recorrendo à triangulação. Neste contexto, triangulação refere-se ao processo de usar várias ferramentas de GenAI para realizar a validação cruzada ou complementar os resultados obtidos, aumentando, assim, a confiabilidade e a qualidade do conteúdo gerado.
A discussão sobre como utilizar as ferramentas de GenAI e como elas deveriam ser exploradas na investigação tem-se intensificado nos últimos meses. Falamos em responsabilidade da IA e, a 13 de março de 2024, a União Europeia aprovou um regulamento (conhecido como Lei da IA) que estabelece as primeiras regras abrangentes para o desenvolvimento, uso e comercialização da Inteligência Artificial.
Pretendemos, aqui, partilhar como diversas aplicações GenAI podem ser aplicadas na escrita de publicações científicas. Independentemente do uso, a proposta não dispensa o conhecimento e a compreensão do investigador/utilizador sobre o conteúdo a ser pesquisado. No exemplo que exploramos, utilizando o tema do presente texto, utilizamos as seguintes aplicações:
- Consensus.app é uma ferramenta (ainda em versão Beta) que simplifica o acesso a artigos científicos a partir de uma pergunta ou questão de investigação;
- Quilbot.com é uma aplicação de reescrita de texto que utiliza inteligência artificial para parafrasear ou resumir conteúdo. Pode ser usado para simplificar a linguagem, evitar plágio ou gerar versões alternativas de um texto;
- Elicit.com usa modelos de linguagem para extrair dados e resumir artigos científicos. A ferramenta gera um resumo com a referência a vários autores. Também é possível ter acesso ao artigo na íntegra e obter mais informações de cada texto (por exemplo: principais resultados, limitações);
- Lex.page é um processador de texto alimentado por IA que funciona de forma muito semelhante a um Google Doc tradicional, com a caraterística adicional de permitir que os utilizadores recorram à assistência da IA sempre que necessário. Utiliza o mesmo modelo que alimenta o ChatGPT;
- Grammarly.com é uma ferramenta de correção gramatical e de estilo que ajuda a melhorar a qualidade da escrita em inglês. Deteta erros de gramática, pontuação, ortografia e estilo, além de oferecer sugestões de melhoria para tornar o texto mais claro, conciso e profissional;
- Perplexity.ai permite que os investigadores gerem, através de uma questão de investigação de partida, outras possíveis sub-questões que os ajudem a desenvolver os seus tópicos investigação. Permite também realizar uma tempestade de questões (brainstorming).
O conhecimento prévio sobre o tópico irá permitir que o autor consiga escrever a instrução (prompt) detalhada, de forma que o resultado seja o pretendido. No caso da plataforma elicit.com, o autor precisa apenas de definir uma questão de investigação (formular boas questões é uma tarefa cognitivamente exigente, na medida em que envolve compreender um problema, organizar ideias, sintetizar etc.). Por ser uma área bastante recente, os LLM (Large Language Model), sistemas de IA treinados com grandes quantidades de dados textuais, apresentam, por vezes, respostas imprecisas. perplexity.ai poderá ajudar nesta formulação. A inserção de uma questão nesta ferramenta, gera, como resultado, um pequeno texto, com referência ao original e, no final, propõe três novas possíveis perguntas. A maioria dos textos gerados pelo perplexity.ai apontam para postagens de blogs, que são escritas por autores com um bom entendimento do tema, mas geralmente não são revistas. Por conseguinte, os resultados podem auxiliar na confirmação ou reformulação da questão inicial do estudo. A partir daqui, podemos avançar para a procura de autores com artigos científicos publicados em revistas. Para isso, recorremos ao elicit.com. De seguida, apresentamos a proposta de resumo e de autores quando realizamos a pesquisa “Triangulate Generative AI tools in writing scientific articles” – elicit.com (consulta realizada no dia 15 de março de 2024):
A range of studies have explored the use of generative AI tools in scientific writing. Griffiths (2004) and Buchkremer (2019) both highlight the potential for these tools to identify and synthesize scientific topics, with Buchkremer (2019) proposing a "double funnel" approach to enhance the literature review process. However, Buriak (2023) and Leung (2023) caution that these tools can produce shallow, error-prone content and emphasize the need for human oversight. Burger (2023) and Grimaldi (2023) provide practical guidelines for using AI in research, with Burger (2023) focusing on systematic literature reviews and Grimaldi (2023) discussing the integration of AI-generated text in scientific articles. Liu (2012) and Guo (2020) present specific applications of AI in academic writing support and health care research, respectively.
A aplicação elicit.com permite consultar uma quantidade de autores bastante superior aos acima referenciados, assim como algumas sínteses sobre o artigo (main findings, limitations, entre outros). Permite, também, ter acesso à referência e, na maioria das vezes, ao DOI (Digital Object Identifier). Nota: de todos os autores sugeridos pelo elicit.com, e após alguns meses de utilização, ainda não detetamos qualquer caso em que o texto fosse inexistente. Importante: ler as partes das publicações apresentadas pelo elicit.com, de forma a validar o que é apresentado pela ferramenta.
Posteriormente, através do consensus.app, melhoramos o texto anterior fortalecendo-o com leituras complementares:
A range of studies have explored the use of generative AI (GenAI) tools in scientific writing. Griffiths (2004) and Buchkremer (2019) both highlight the potential for these tools to identify and synthesize scientific topics, with Buchkremer (2019) proposing a "double funnel" approach to enhance the literature review process. However, Buriak (2023) and Leung (2023) caution that these tools can produce shallow, error-prone content and emphasize the need for human oversight. Burger (2023) and Grimaldi (2023) provide practical guidelines for using AI in research, with Burger (2023) focusing on systematic literature reviews and Grimaldi (2023) discussing the integration of AI-generated text in scientific articles. Liu (2012) and Guo (2020) present specific applications of AI in academic writing support and health care research, respectively. GenAI can aid in research idea generation, academic writing, and English writing learning, but critical thinking is crucial for maintaining rigorous scholarly standards (Hsiao-Ping Hsu et al., 2023).
Apesar de estar ainda na versão beta, o consensus.app permite a procura de artigos que poderão estar indexados em diferentes bases de dados. Isto não exclui a necessidade de, dependendo do tipo de revisão que estamos a realizar, consultar diretamente algumas bases de dados (por exemplo: Scopus ou Web of Science). Posteriormente, podemos recorrer ao quilbot.com para melhorar o nosso texto (escrita de sínteses, verificação de plágio, entre outros) e ao grammarly.com para correção gramatical, caso o conteúdo seja redigido em língua inglesa.
Various studies have investigated the application of generative artificial intelligence (GenAI) methods in scientific writing. Griffiths (2004) and Buchkremer (2019) emphasize the capacity of these tools to detect and combine scientific subjects, with Buchkremer (2019) suggesting a "double funnel" method to improve the process of reviewing the literature. Nevertheless, Buriak (2023) and Leung (2023) warn that these tools have the potential to generate superficial and unreliable material, highlighting the importance of human supervision. Burger (2023) and Grimaldi (2023) offer practical recommendations for utilizing AI in research. Burger (2023) specifically addresses the application of AI in systematic literature reviews, while Grimaldi (2023) explores the incorporation of AI-generated text in scientific articles. Liu (2012) and Guo (2020) demonstrate distinct implementations of artificial intelligence in academic writing assistance and healthcare research. GenAI can assist in generating research ideas, academic writing, and learning English writing. However, it is essential to have critical thinking skills to uphold rigorous scholarly norms (Hsiao-Ping Hsu et al., 2023).
lex.page pode ser usado em paralelo com as outras ferramentas ao longo da escrita. Permite fazer uma exploração ao rascunho apresentado e propor eventuais melhorias ao texto. Nesta fase, é importante que o autor tenha conhecimento de como escrever uma boa instrução (prompt). A instrução necessita, na maioria dos casos, de ser refinada para que o resultado obtido vá ao encontro do que o autor necessita. Recorrendo ao lex.page, talvez o início deste texto ficasse melhor da forma como apresentamos a seguir. O que lhe parece?
A utilização de ferramentas de inteligência artificial (IA) generativas na escrita de artigos científicos apresenta-se como uma estratégia promissora, sobretudo em fases como a revisão bibliográfica, análise de dados e a elaboração de esboços preliminares de projetos. No âmbito científico, a triangulação diz respeito ao processo de aplicação de múltiplos modelos de IA ou ferramentas com o objetivo de validar cruzadamente os resultados ou completando informações entre si, o que, por sua vez, enriquece e eleva a confiabilidade e o rigor dos conteúdos “gerados”. Existem intensos debates sobre como as ferramentas de IA Generativa devem ser empregadas na investigação e discute-se, amiúde, a responsabilidade da IA. Recentemente, foi divulgado o regulamento europeu relativo à utilização de IA. Este texto pretende partilhar a minha vivência na escrita de trabalhos científicos e explorar o potencial contributo das ferramentas de IA Generativa para o processo de escrita, centrando-se principalmente em textos de índole científica. Reconheço que esta proposta possa originar controvérsia, contudo, tenho a intenção de apresentar as constatações que fui recolhendo ao longo da minha prática no emprego e treino de algoritmos durante a avaliação de artigos, onde identifiquei indícios do uso destas ferramentas, embora sem conseguir comprová-lo de forma inequívoca. Será assim tão imperativo comprovar o uso de ferramentas de IA na avaliação de artigos científicos, ou deveríamos canalizar os esforços na sensibilização para a sua exploração consciente e assim melhorar o valor do que produzimos?
O cuidado com a utilização da IA persiste, especialmente no que diz respeito às questões éticas de plágio, propriedade intelectual e privacidade de dados. No entanto, ao explorar, refletir e aprender sobre as ferramentas de IA disponíveis, podemos transformá-las em verdadeiros “parceiros de pensamento”, otimizando nosso tempo na procura de novos conhecimentos e aprimorando a qualidade da investigação. Em outras palavras, ao utilizar a IA de forma estratégica, as informações podem ser adquiridas de maneira mais eficiente, proporcionando ao investigador um tempo valioso para reflexão, o que, por sua vez, melhora as suas capacidades de pensamento. Além disso, é importante destacar a relevância de tomar notas ao realizar a escrita científica. Recomendamos que, ao utilizar GenAI como auxílio, o investigador forneça à ferramenta um resumo completo, incluindo contexto, “gap” ou lacunas do estudo identificadas, objetivos, metodologia, resultados e conclusões. Isso garante que a IA compreenda o âmbito do estudo e possa contribuir com insights relevantes e coerentes.
A triangulação de ferramentas de IA Generativa não só é possível como eficaz. Este texto apresenta uma possível proposta que, acreditamos, deve ser ajustada dentro de poucos meses, quer pelo contínuo desenvolvimento das ferramentas aqui apresentadas, quer pelo surgimento de novas.